Ligados & Integrados

Ovos embrionados são usados como matéria-prima de vacinas animal e humana

Granjas exclusivas fornecem ovos para os centros de pesquisas. Um deles, o Butantan, produz vacina contra a Influenza

Dos ovos fecundados que vamos falar não nascem pintinhos. São ovos controlados cujos embriões serão utilizados em um processo muito especial: produzir vacinas para imunização animal e humana. Uma dessas vacinas, por exemplo, é aquela que nos protege do vírus Influenza. O biólogo Geraldo Cupertino contou à equipe de reportagem do Ligados & Integrados como é realizado o manejo nas granjas que produzem ovos férteis para a produção de vacinas.

Criação das matrizes: diferente das granjas convencionais

As granjas que fornecem embriões para a produção de vacinas são exclusivas. Cupertino conta que o processo é bem diferente daquele realizado nas granjas de matrizes de frango de corte, já que envolve a produção de medicamentos. “Estamos falando de produtos que serão injetados em seres humanos, por isso, as granjas são totalmente isoladas. O processo de incubação dos ovos leva até 11 dias, dependendo da cepa que será produzida, e os embriões são transferidos em veículos específicos até seu destino, que pode ser o Instituto Butantan”, explica o biólogo. O cliente, como o Instituto Butantan, realiza a inoculação do vírus e inicia de fato a produção da vacina.

Nessas granjas, há um rígido controle sanitário que se estende aos colaboradores. O acesso às aves é extremamente restrito justamente para proteger o plantel. Existe uma segurança muito maior na produção dos ovos e alguns procedimentos são diferenciados. Por exemplo: não são todas as vacinas e medicamentos que podem ser usados nas matrizes. “São galinhas de linhagens comerciais, a única diferença é a maneira como elas são conduzidas desde o período de incubação. Existe uma normativa que deve ser obedecida. Esse ovo é produzido em uma granja muito bem estruturada para atender à demanda. A responsabilidade é grande, porque são milhões de pessoas recebendo um produto sob nosso controle”, diz Cupertino.

Os ovos passam por uma seleção. São pesados e separados por categorias, e nem todos vão gerar embriões. Antes de sair da empresa fornecedora, é realizado um procedimento chamado ovoscopia em cem por cento dos ovos para a retirada dos embriões inférteis, que não se desenvolveram ou que morreram durante o trajeto. “Só os embriões viáveis, que varia entre 88% a 90% dos ovos, são enviados ao cliente”, explica Cupertino. 

Muito além da produção de alimentos

A aprovação das vacinas humanas fica a cargo do Ministério da Saúde, já a aprovação das vacinas para animais é de responsabilidade do Ministério da Agricultura e Pecuária. Os embriões são utilizados tanto para a linha veterinária quanto para a linha humana. Na empresa em que Cupertino atua, o maior volume produzido é destinado à vacina contra a Influenza. “São cerca de 80 milhões de doses por ano no país. Os ovos já são usados, inclusive, para produzir a vacina contra o coronavírus, mas na linha veterinária. Em relação ao novo coronavírus transmitido entre humanos, existem testes sendo realizados e há uma grande chance de, no futuro, serem produzidas em embriões, ainda hoje o meio de cultura mais barato e eficaz para produzir vacinas”, diz ele. São a avicultura e a ciência caminhando juntas, muito além da produção de alimentos. “Tudo está relacionado, uma coisa depende da outra. É um processo que exige bastante, mas também é muito satisfatório saber que podemos contribuir com uma nação e, quem sabe amanhã, até com outros países”, finaliza. 

Durante a campanha, Instituto Butantan recebe 520 mil ovos por dia

De acordo com Antônio Pereira da Silva, gerente de produção do Instituto Butantan, mais de um milhão de aves nascem em prol da saúde pública. Todos os dias, durante a campanha de produção da vacina contra a Influenza, são recebidos aproximadamente 520 mil ovos embrionados, ou, popularmente falando, com pintinhos em estágio inicial de desenvolvimento. “Realizamos testes microbiológicos e de vitalidade nos embriões e,  posteriormente, é iniciado o processo de inoculação, em que injetamos o vírus dentro dos ovos. O embrião serve como meio de cultura, já que o vírus precisa de uma célula viva para se replicar. Para que isso aconteça, os ovos são colocados novamente em uma incubadora por tempo determinado. Posteriormente, recolhemos o líquido com o vírus replicado e realizamos os processos de purificação, filtração e fragmentação. Os processos finais para a produção da vacina são inativação e filtração esterilizante”, explica. 

Muitas vacinas utilizam ovos embrionados como matériaprima principal. Graças à utilização dos ovos, a produtividade é maior. A produção de vacinas aumenta, já que as aves botam um ovo por dia. Antônio diz que com os embriões o volume desejado é mais facilmente atingido. “Hoje, temos capacidade de produzir 90 milhões de doses de vacina contra a Influenza, com perspectiva de aumento. Colocamos uma quantidade muito pequena de vírus dentro do ovo. Se eu colocar dez vírus, por exemplo, após 72 horas, dependendo da cepa, eles se transformam em milhares de vírus. Nosso produto agregado está ali”, conclui.