POR RICARDO SANTIN

Sustentabilidade e a aptidão setorial

Hoje, a sustentabilidade é um cliché, não é mais uma vantagem competitiva, é uma expectativa

Sustentabilidade e a aptidão setorial
Foto: Envato

Há quase 50 anos, na capital sueca, era realizada a primeira Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento.

Ali era amadurecida a ideia de desenvolvimento sustentável, ideia que ganharia força em novas investidas globais, a exemplo da Eco-92, no Rio de Janeiro.

As investidas do passado frutificaram e, hoje, a sustentabilidade é um cliché.

Não é mais uma vantagem competitiva, é uma expectativa. A atitude sustentável tornou-se uma obrigação e cresce como um hábito para os cidadãos, e uma regra para as empresas.

E, na ansiedade pela busca de atitudes sustentáveis, a lupa embaçada de alguns vigilantes podem cometer graves injustiças.

Exemplos disto são propostas que determinadas organizações lançam rotineiramente, sob a égide da (pseudo)sustentabilidade. Faço referência a exemplos da “segunda sem carne” e outras propostas que buscam o banimento do consumo de proteínas de altíssima qualidade, como a proteína animal.

Não busco aqui lançar ideias sobre as reais motivações destas iniciativas – afinal, poderia incorrer em cometer as mesmas injustiças que nos acometem. Mas faço um reforço à necessidade de aprofundamento técnico-científico neste debate que, ante à união de esforços em busca de soluções, tem permeado caminhos por águas rasas, encalhado em argumentos passionais.

Neste devaneio de equívocos, surgem mitos que, por vezes, conflitam com os princípios de seus militantes. Afinal, reduzir o consumo de carne é uma ideia que alcança os três pilares de sustentabilidade estabelecidos na Declaração de Política de 2002 da Cúpula Mundial realizada pela ONU em Joanesburgo – sendo, portanto, economicamente viáveis, socialmente aceitáveis e de baixo impacto ambiental?

Nessa análise cabe uma palavra-chave sobre a qual é merecida uma reflexão: aptidão.

Para aqueles que verdadeiramente conhecem o setor agropecuário brasileiro, é sabido que o Brasil possui características naturais que favorecem a produção de alimentos, sendo essas características de ordem ambiental, climática, territorial e cultural.

A vasta disponibilidade de insumos, tais como grãos, água e terra, permite melhor competitividade; o clima favorável propicia tanto a disponibilidade desses insumos quanto o menor consumo energético nos sistemas produtivos; o sistema de integração permite melhor controle sanitário e impacto social. Tudo isso somado a uma legislação ambiental bastante restritiva.

A também cinquentenária avicultura é exemplo disso, assim como a suinocultura.

Empenhadas na aplicação de novas tecnologias para ganhos produtivos com menor demanda de insumos, segue rígidos protocolos e investe em inovações de redução de impactos em iniciativas que vão da granja ao transporte dos produtos acabados.

Tudo isto em cadeias produtivas intensivas em mão-de-obra, com forte geração de emprego e renda, especialmente em regiões menos industrializadas. Fixam o homem no campo e contribuem para a melhora da renda na cidade, com impactos diretos no desenvolvimento humano.

Ao mesmo tempo, ofertam alimentos acessíveis, geram riquezas para o país. No campo brasileiro, a produção de uma ave emite metade do CO² de uma ave produzida em solo britânico – informação do próprio Departamento de Desenvolvimento Rural e Alimentação do Reino Unido.

É claro que todas as atividades agrícolas e agropecuárias enfrentam desafios constantes para a manutenção do equilíbrio entre o uso dos recursos naturais e a produção de alimentos acessíveis. Não se pode negar a necessidade de aprimoramento constante que permita uma produção mais limpa, eficiente e, ao mesmo tempo, competitiva.

Afinal, esse é o verdadeiro conceito de desenvolvimento sustentável: aquele que permite o crescimento econômico necessário, garantindo a preservação do meio ambiente e o desenvolvimento social para as gerações atuais e futuras.

Neste sentido, a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) vem trabalhando fortemente em campanhas em prol do desenvolvimento sustentável, com o apoio às iniciativas para atendimento às metas da ONU – os ODS – em especial sobre cinco objetivos definidos pelo Conselho Mundial da Avicultura como prioritários.

O tema fome e o lema “sem fronteiras para alimentos” são bandeiras erguidas pela associação e pelo setor, reforçando ao mundo a aptidão brasileira para auxiliar na oferta de alimentos global.

A responsabilidade do Brasil como grande provedor de alimentos para o mundo se reforça ainda mais nesse momento de pandemia.

A produção sustentável de aves, suínos e ovos é uma evolução constante, em que cada iniciativa conta para esse processo, como o atendimento de mercados diversos permite a distribuição de produtos para as mais diferentes culturas, com agregação de valor a todos os cortes de acordo com suas necessidades.

Ao mesmo tempo, vários projetos que resultarão em melhor desempenho produtivo e menor perda foram iniciados e ou concluídos na agenda de trabalho setorial como iniciativas em estudo e implantadas nas unidades produtoras, voltadas para a redução do desperdício, com preservação da qualidade.

A segurança alimentar não pode ser garantida sem considerar a aptidão das diferentes regiões e sua população. É preciso que haja desenvolvimento para todos.

Para tanto é necessário reconhecer os limites e a responsabilidade que estes nosimpõem. Afinal, ser sustentável é considerar a essencialidade do meio ambiente. É, também, considerar que a sociedade precisa de desenvolvimento, e reconhecer que a desnutrição em todas as suas formas continua a ser um desafio para o mundo.